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Expiação Limitada Protestantismo

AGOSTINHO DEFENDEU UMA VONTADE SALVÍFICA LIMITADA? RESPONDEMOS QUE SIM, CONTRA OPOSITORES.

A questão proposta pelo arrazoado acima é que Pelágio defendeu que Deus não quer salvar todos os homens sem exceção, contra Agostinho, que defendeu que Deus quer salvar todos os homens sem exceção.

Em primeiro lugar, o próprio autor do texto não coloca citação alguma do próprio Pelágio afirmando tal coisa. Não há palavras de Pelágio em que o mesmo afirma que Deus não quer a salvação de todas as pessoas sem exceção.

A citação usada sequer sugere isso, vejamos:

“Os pelagianos dizem que Deus não é salvador, libertador e purificador dos homens de todas as épocas” (Santo Agostinho, Epist. Pelag: 1. 2. c. 2.)

Notem, que Agostinho não diz:

“Os pelágianos dizem que Deus não é o Salvador, Libertador e purificador de TODOS os homens de todas as épocas”

Mas apenas de “homens de todas as épocas”. A ideia não é tratar de uma vontade salvífica universal, mas de homens, dentro do conjunto dos que foram salvos, que não teriam sido purificados pelo sangue de Cristo. Não se trata da humanidade inteira, mas dentre o grupo dos salvos, alguns não terem sido salvos pelo sangue de Cristo.

O debate de Agostinho contra Pelágio, em certo momento, girou em torno da salvação das crianças. Agostinho usa o argumento de que as crianças não batizadas não são salvas, e não são salvas porque possuem o pecado original, portanto nascem condenadas e culpadas, logo, se se nega o pecado original, então se nega, também, a necessidade do batismo infantil. Se tais crianças não precisam do batismo, então elas seriam todas salvas sem a necessidade do sacrifício de Cristo.

Notem, o universo que Agostinho trata está dentro do conjunto dos salvos, ou seja, se não há pecado original, como os pelagianos ensinavam, então há pessoas salvas sem o sacrifício de Cristo, não está em questão se há pessoas que não são salvas porque Cristo não morreu por elas, que seria, basicamente, o argumento contra a expiação limitada, mas se há pessoas salvas sem precisar do sacrifício de Cristo.

Agostinho acusa Pelágio baseado em uma dedução de sua doutrina, não de um ensino direto de Pelágio.

Segundo Agostinho, se crianças nascem inocentes, então a graça batismal não libertaria, não redimiria, nem resgataria tais crianças, e esse seria o erro pelagiano. Agostinho diz:

“Você diz que eles são redimidos, mas não são libertos, são lavados, mas não são limpos – essas são suas opiniões monstruosas: esses SÃO OS PARADOXOS DOS HEREGES PELAGIANOS, mas peço-te que me diga como pode esta redenção ser compreendida, se ela não resgata do mal o Israel que redimiu de todos os seus pecados? Pois onde quer que façamos menção à redenção, também se entende um resgate: e o que faz tal coisa senão o precioso sangue do imaculado cordeiro Jesus Cristo?” (Contra Juliano livro 3 cap. 3)

Veja, a questão não era se os pelagianos negavam uma vontade salvífica universal, mas se crendo que a vontade de salvar é universal, como responderiam à necessidade do Batismo. Para que o batismo se a criança não precisa de regeneração? Esse foi o dilema proposto por Agostinho contra os pelagianos.

Agostinho também ensina que as crianças necessitam de redenção do pecado, assim como adulto precisa, ou terão o mesmo destino:

“Longe de mim deixar de lado a questão das crianças de modo a dizer que se trata de algo incerto, ou seja, ou se, regeneradas em Cristo e MORRENDO NA IDADE INFANTIL, PASSAM PARA A VIDA ETERNA, OU SE, NÃO REGENERADAS, SÃO VÍTIMAS DA SEGUNDA MORTE, pois está escrito e não se pode interpretar de outro modo: Por meio de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, e assim a morte passou a todos os homens (Rm 5,12). E da morte eterna, que é uma justa retribuição ao pecado, somente liberta, sejam crianças ou adultos, aquele que morreu pela remissão dos pecados originais e dos nossos pessoais, sem estar ele manchado com o pecado original ou pessoal.” (O Dom da Perseverança. Cap XII)

Quando perguntado o porquê de haver crianças salvas e outras não, Agostinho rapidamente atribui à vontade de Deus e diz que Deus não quer salvar a todas, contradizendo frontalmente o autor do texto:

“Não se deve também atribuir à negligência dos pais o fato de as crianças morrerem sem o batismo, sem nenhuma intervenção dos juízos divinos, como se as crianças, que morrem deste modo, tivessem escolhido deliberadamente pais descuidados dos quais viessem a nascer. Neste caso, o que dizer de uma criança que morre antes que possa ser socorrida pelo ministério de quem a pode batizar? Pois, muitas vezes os pais se apressam e os ministros estão preparados para a administração do batismo a uma criança, mas o sacramento não é conferido PORQUE DEUS NÃO QUER, já que não lhe conservou a vida por mais um pouco o suficiente para que lhe fosse conferido. O que dizer também perante o fato de Deus socorrer algumas vezes os filhos menores de pagãos, evitando-lhes a condenação, e não socorrer os filhos de cristãos?” (O Dom da Perseverança. Cap XII)

O argumento de Santo Agostinho é tão incisivo, que ele usa o exemplo de uma criança justamente para o pelagiano não ter como usar o argumento de que ela não foi salva devido aos atos maus que ela cometeu. Ele ainda complementa dizendo a criança não tem culpa de ter nascido em uma família de pais descuidados, porém sua perdição não pode ser atribuída sequer à negligência dos seus pais, mas à providência divina e a vontade de Deus. Essa citação também derruba a alegação da existência de uma vontade antecedente e consequente e Agostinho, pois como explicar uma vontade antecedente e consequente em uma criança, se elas não podem resistir à vontade divina?

Esse argumento seria suficiente para refutar o autor do texto da imagem, mas continuemos, pois argumentos nunca são demais.

AGOSTINHO E OS TEXTOS BÍBLICOS

Agostinho, quando comentou a respeito de 1 Tm 2.4, foi enfático ao dizer que Deus não quer salvar a todas as pessoas sem exceção:

“A respeito da afirmação: Quer que todos os homens sejam salvos (1Tm 2,4) e, não obstante, nem todos se salvem, admite várias interpretações, das quais comentamos algumas em outros escritos. Aqui mencionarei apenas uma. Está escrito: Quer que todos os homens sejam salvos, ABRANGENDO TODOS OS PREDESTINADOS, porque há no meio deles todo gênero de pessoas. Tem o mesmo sentido que a afirmação de Cristo aos fariseus: Pagais o dízimo de todas as hortaliças, entendendo-se todas as que colhiam, mas não pagavam o dízimo de todas as hortaliças existentes no mundo. No mesmo estilo de expressar, diz o Apóstolo: Assim como eu mesmo me esforço por agradar a todos em todas as coisas (1Cor 10,33). Será que ele agradava também a todos os seus perseguidores? Ele agradava todo gênero de pessoas reunidas pela Igreja de Cristo, tanto os já convertidos como os futuros.” (A Correção e a Graça – Cap XIV)

Nesse texto, de 1 Tm 2.4, o apóstolo Paulo diz: “Deus quer que todos os homens sejam salvos”, ora, se Agostinho realmente pensasse em uma vontade salvífica universal, esse texto seria um “prato cheio”. É totalmente contra-intuitivo pensar que Agostinho interpretaria esse texto de forma diferente, caso sua crença fosse de uma vontade salvífica universal.

Mas Santo Agostinho consegue nos surpreender ainda mais, revelando mais ainda o erro do opositor. O conhecido texto de 1 Jo 2.2 que diz: “E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo.”, também é interpretado por Agostinho como uma referência a um número restrito de pessoas. Ele diz:

“Temos Jesus Cristo, o justo, e ‘Ele é a propiciação pelos nossos pecados; Não somente os nossos pecados, mas também os pecados de todo o mundo’ (1 Jo 2.2). O que significa isso, irmãos? Certamente a encontramos nos campos das florestas, encontramos a Igreja em todas as nações.  Eis que Cristo é a propiciação pelos nossos pecados; não apenas nossos, mas também os pecados de todo o mundo. Eis que tens a Igreja em todo o mundo”. (Santo Agostinho Comentário a 1Jo 2.2)

Novamente, é totalmente contra-intuitivo pensar que Agostinho interpretaria esse texto de forma diferente, caso sua crença fosse a vontade salvífica universal.

AGOSTINHO DEFENDEU UMA VONTADE ANTECEDENTE E CONSEQUENTE?

O conceito de vontade antecedente e consequente pode ser resumido da seguinte forma, apesar de suas muitas variações: Deus quer salvar a todos em um determinado momento, mas ao considerar algo ou alguma atitude da criatura, passa a querer salvar somente os que creem, esses serão os eleitos. Os defensores desse conceito afirmam que Agostinho, quando afirma que Deus não quer salvar a todos sem exceção, refere-se somente à vontade consequente, não a uma vontade antecedente. Em outras palavras, Agostinho defendeu uma vontade limitada de salvar somente quando já considerado ato da criatura.

Alguns usam o argumento do Concílio de Trento, que diz:

“Deus não ordena coisas impossíveis, mas ao ordenar, Ele vos adverte que deveis fazer o que podeis e pedir o que não podeis, e ele ajudará a fim de que possais” (Sess. VI, cap. XI).

Daqui eles deduzem que Agostinho ensinou que ninguém pode se perder a não ser que tenha a oportunidade de crer, já que Deus não ordenaria o impossível. Essa frase de Trento é atribuída a Agostinho.

Porém, o que Santo Agostinho de fato ensina é:

“Os pelagianos acreditam que fizeram uma grande descoberta, quando nos dizem que Deus não ordenaria aquilo que Ele sabe ser impossível aos homens. Quem é que ignora isto? Porém, ele nos ordena certas coisas que nós não podemos fazer, a fim de que nós saibamos o que lhe devemos pedir” (A Graça e a Liberdade, Cap XVI).

No seguir do capítulo, Agostinho argumenta que não há um impedimento radical a qualquer homem de cumprir os mandamentos, e cada um poderá cumprir, se quiser, mas disso não se pode deduzir que Agostinho se refere a todos os homens do planeta, mas aos homens que podem ser ajudados por Deus, ou seja, os cristãos. Ele não está tratando de homens que não conhecem o evangelho.

Em outra obra Agostinho ensina que é impossível ao homem cumprir toda a lei de Deus, não havendo perfeição cristã:

“Caríssimo filho Marcelino, elaborei recentemente a teu pedido as obras sobre o batismo das crianças e a perfeição da santidade no homem. Parece que ninguém alcançou esta perfeição ou alcançará nesta vida, com exceção do único Mediador, o qual, imune de todo pecado, experimentou a fragilidade humana à semelhança da carne de pecado. Após teres lido os referidos tratados, tornaste a escrever-me confessando que te causou inquietação o que afirmei no segundo deles sobre a possibilidade de um ser humano viver sem pecado, se não lhe faltarem a vontade e o auxílio divino. Contudo, esta perfeição não a teve nem terá nenhum ser humano aqui no mundo, excetuando aquele no qual todos receberão a vida (1Cor 15,22).” (AGOSTINHO. Espírito e a Letra. Capítulo 1.1).

Novamente:

“Talvez me responderás que estes fatos mencionados, não acontecidos, mas que poderiam acontecer, seriam obras divinas. Mas o fato de o ser humano viver sem pecado pertence à esfera humana e é a ação mais excelente, visto que por ela se realiza a plena e perfeita santidade na sua máxima expressão. Portanto, é inacreditável que tenha existido ou possa existir alguém que tenha realizado esta ação, na hipótese de que o ser humano a possa realizar.” (AGOSTINHO. Espírito e a Letra. Capítulo 2.2)

É um fato que Deus ordena que o homem cumpra toda a lei, mas Agostinho ensina que isso é impossível, portanto Deus ordena o impossível ao homem, logo, esse argumento não pode fundamentar um conceito de vontade antecedente e consequente em Agostinho.

Contrário ao que os opositores ensinam, Agostinho argumentou contra uma vontade antecedente e consequente. Esses termos não aparecem em Agostinho, embora o conceito possa ser visualizado. Em seu debate contra Juliano, Agostinho mostra que esse conceito é pelagiano e que não compartilha com esse pensamento. Observem o argumento de Agostinho contra Juliano:

“42. Cita também um texto do Apóstolo que deixa a porta aberta a quem bate, PORQUE DEUS QUER QUE TODOS OS HOMENS SE SALVEM E CHEGUEM AO CONHECIMENTO DA VERDADE (1 Tm 2.4), e queres que entendamos, de acordo com teu entendimento, QUE SE TODOS OS HOMENS NÃO SE SALVAM NEM CHEGAM AO CONHECIMENTO DA VERDADE, É PORQUE NÃO QUEREM PEDIR O QUE DEUS LHES QUER DAR; NÃO QUEREM BUSCAR, QUANDO DEUS QUER SER ENCONTRADO, E NÃO QUEREM CLAMAR, QUANDO DEUS QUER CONCEDER. MAS ESTA VOSSA EXEGESE É INVALIDADA PELO SILÊNCIO DAS CRIANÇAS, QUE NEM PEDEM, NEM PROCURAM, NEM CHAMAM; E, QUANDO SÃO BATIZADOS, RESISTEM, CHORAM E, A SEU MODO, PROTESTAM; NO ENTANTO, ELAS RECEBEM, ENCONTRAM, É ABERTO PARA ELAS E ENTRAM NO REINO, ONDE ENCONTRAM A SALVAÇÃO ETERNA E O CONHECIMENTO DA VERDADE; MAS HÁ MUITOS QUE NÃO RECEBEM ESTA GRAÇA DE ADOÇÃO DAQUELE QUE QUER QUE TODOS OS HOMENS SEJAM SALVOS E CHEGUEM AO CONHECIMENTO DA VERDADE. Certamente não se pode dizer deles: Deus quis, e eles não quiseram; porque, se Deus quer, quais dessas crianças, que carecem de livre arbítrio da vontade pode resistir à Sua vontade onipotente? Porque não entender esta frase: “Ele quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” no mesmo sentido em que entendemos a passagem de Paulo aos Romanos: “Pela justificação de um, a justificação da vida para todos os homens?”

“Deus quer que se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade, todos aqueles que pela justificação de um só obtêm uma graça de uma justificação que dá vida. ELES NÃO SÃO HOMENS E NÃO DEVEM SER CONTADOS ENTRE AQUELES DE QUEM ESTÁ ESCRITO: TODOS OS HOMENS? OU HÁ ALGUÉM QUE DIZ: “DEUS QUER SALVÁ-LOS, MAS ELES NÃO?” COMO SE AS CRIANÇAS TIVESSEM CONHECIMENTO DE QUERER OU NÃO QUERER!”

“Não é evidente que as crianças que morrem após receber o batismo e, pela graça sacramental, chegam ao conhecimento da verdade, que o reino de Deus é pleno, não chegam porque quiseram ser regeneradas pelo batismo de Cristo? Então, se alguns não são batizados porque não querem e outros não são batizados porque querem, POR QUE DEUS, QUERENDO QUE TODOS OS HOMENS SE SALVEM E CHEGUEM AO CONHECIMENTO DA VERDADE, PERMITE QUE UMA MULTIDÃO DE CRIANÇAS NÃO ALCANCE SEU REINO, ENQUANTO HÁ UM CONHECIMENTO PERFEITO DA VERDADE, SE NELES NÃO ENCONTRA NENHUMA RESISTÊNCIA POR PARTE DE SEU LIVRE ARBÍTRIO?” 43. A menos que você vá dizer que naqueles todos que Deus quer que sejam salvos, os filhos não são contados; porque, se não tiverem nenhum pecado de herança, são salvos com a salvação de que fala o texto. Mas então você cai em um absurdo maior, porque assim você torna Deus benevolente com os homens mais ímpios e criminosos do que com aqueles que são mais inocentes e não têm mancha de pecado; Bem, se ele quer que todos os homens sejam salvos, ele quer que os ímpios entrem em seu reino, com uma condição: se eles forem salvos; e se forem salvas; e se não quiserem ser salvas, a culpa é delas.

“QUANTO AO NÚMERO INCONTÁVEL DE CRIANÇAS QUE MORREM SEM BATISMO, DEUS NÃO AS QUER ADMITIR NO SEU REINO, EMBORA, SEGUNDO VÓS, NENHUM PECADO LHES FECHE A PORTA, E NINGUÉM QUESTIONE O FATO DE AS CRIANÇAS NÃO PODEREM RESISTIR À VONTADE DE DEUS COM A SUA PRÓPRIA VONTADE. Assim, seria necessário dizer que Deus quer que todos os homens sejam cristãos, e muitos não querem, e que ele não quer todos eles, entre os quais não há ninguém que não queira; e isso é contrário à verdade, pois o Senhor conhece aqueles que são seus; e sua vontade conhecida é que todos os que entram no reino sejam salvos. Portanto, a perícope: Ele quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade (1 Tm 2.4) deve ser entendida no mesmo sentido que esta: pela justificação de um para a justificação da vida de todos os homens.”

“Se você acredita que o texto do Apóstolo pode ser interpretado de tal forma que todos querem significar muitos que são justificados em Cristo – outros não são vivificados em Cristo -, você pode responder isso na passagem onde se lê: Ele quer todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade (1 Tm 2.4), todos, na verdade, significa muitos, que são os que ele quer que cheguem a esta graça. Este sentido parece estar mais de acordo com o que foi dito em outro lugar, porque ninguém vem a Deus senão aquele que Ele quer fazer vir: ninguém pode vir a mim, diz o Filho, se o Pai, que me enviou, não atrair; e logo depois: Ninguém pode vir a mim se o Pai não o conceder. E, consequentemente, todos aqueles que são salvos e chegam ao conhecimento da verdade são salvos porque é a vontade de Deus e eles vêm a ele porque ele quer. Alguns, como as crianças, que não podem fazer uso de seu livre arbítrio, são regenerados porque ele quer, assim como foram criados porque ele os criou; o outro, no pleno uso do seu livre arbítrio, não pode querer o bem se não o quiser e se, por graça, não preparar a sua vontade. 45. Se você me perguntar agora: “POR QUE DEUS NÃO MUDA A VONTADE DE TODOS AQUELES QUE NÃO QUEREM?” Eu vou te responder: POR QUE ELE NÃO ADOTA PELO BATISMO DE REGENERAÇÃO TODAS AS CRIANÇAS QUE VÃO MORRER, NAS QUAIS NÃO HÁ VONTADE E, CONSEQUENTEMENTE, NÃO PODEM QUERER ALGO CONTRA A VONTADE DIVINA? Se isto é para vós um mistério insondável que ultrapassa a vossa inteligência, consideremos ambos como mistério profundo porque Deus quer, nos adultos e nas crianças, salvar uns e não outros; mas tenhamos como certo e infalível que em Deus não há injustiça e que ele não condena ninguém sem demérito; embora sua bondade seja tão grande que ele salva muitos sem nenhum bom mérito; Assim, demonstra, naqueles que condena, o que é devido a todos, e os que salva, aprendam a pena que lhes foi reservada, e da qual são libertos, e a imensa graça que Deus lhes concede sem merecer.” (Contra Juliano. Livro IV – http://www.augustinus.it/spagnolo/contro_giuliano/index2.htm)

Agora, notem o pensamento de Juliano e como Agostinho o descreve, os termos entre parênteses foram acrescentados por mim para uma melhor visualização do leitor:

“Que se todos os homens não se salvam nem chegam ao conhecimento da verdade (vontade antecedente), é porque não querem pedir o que Deus lhes quer dar (vontade consequente); não querem buscar (vontade consequente), quando Deus quer ser encontrado (vontade antecedente), e não querem clamar (vontade antecedente), quando Deus quer conceder (vontade antecedente)

Agostinho rejeita a distinção, depois responde:

“Mas esta vossa exegese é invalidada pelo silêncio das crianças, que nem pedem, nem procuram, nem chamam; e, quando são batizados, resistem, choram e, a seu modo, protestam; no entanto, elas recebem, encontram, é aberto para elas e entram no reino, onde encontram a salvação eterna e o conhecimento da verdade; mas há muitos que não recebem esta graça de adoção daquele que quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade. certamente não se pode dizer deles: Deus quis, e eles não quiseram; porque, se Deus quer, quais dessas crianças, que carecem de livre arbítrio da vontade pode resistir à Sua vontade onipotente?

Como aplicar uma vontade antecedente e consequente em crianças que não podem resistir a vontade de Deus, nem mesmo aceitar a vontade de Deus? Os opositores podem argumentar que isso vale somente para adultos, mas não é verdade, Agostinho também responde a essa objeção:

“Se você me perguntar agora: “por que Deus não muda a vontade de todos aqueles que não querem?” eu vou te responder: por que ele não adota pelo batismo de regeneração todas as crianças que vão morrer, nas quais não há vontade e, consequentemente, não podem querer algo contra a vontade divina? Se isto é para vós um mistério insondável que ultrapassa a vossa inteligência, consideremos ambos como mistério profundo porque deus quer, nos ADULTOS e nas CRIANÇAS, salvar uns e não outros;

Se Agostinho cresse em vontade antecedente e consequente, certamente ele diria que a razão pela qual crianças e adultos são salvos e outros não, seria porque um não impediu a graça e outro impediu a graça, não apelaria para o mistério insondável da vontade absoluta de Deus, que considera nada além de sua própria vontade para salvar, pois como diz Santo Agostinho, se houvesse qualquer consideração na coisa querida, seria injusto condenar qualquer criança enquanto um adulto é salvo, pois crianças não cometem pecados atuais, mas adultos já cometeram vários deles (Contra Juliano, Livro IV).

O QUE OS ACADÊMICOS DIZEM?

Roque Frangiotti, ERUDITO AUTOR CATÓLICO ROMANO, anticalvinista, como é patentemente visto em seus escritos, tradutor e comentarista dos “verdinhos” da Paulus, um homem acima de qualquer suspeita, ensina que APÓS O ANO DE 421, Agostinho nunca mais falou em uma vontade salvífica universal, mas sempre em uma vontade salvífica limitada. Ele diz:

“Com isso, Agostinho ensina uma vontade de Deus salvífica limitada. Deve-se ter por firme que Deus é absolutamente justo, mesmo se uma explicação desta justiça não é de fato possível, diz Agostinho. DEPOIS DE 421, ENSINOU QUE DEUS DESTINOU À SALVAÇÃO APENAS AQUELES QUE EFETIVAMENTE ALCANÇAM A SALVAÇÃO (De fide, spes et caritate, cap. 103). Os outros são predestinados ao eterno aniquilamento (ad sempiternum interitum; C. Iulianum IV). AGOSTINHO NÃO MENCIONOU JAMAIS A DOUTRINA SEGUNDO A QUAL “DEUS QUER QUE TODOS OS HOMENS SE SALVEM” (1Tm 2,4)”. (FRANGIOTTI, Roque. Coleção Patrística. Graça II. Santo Agostinho. Introdução. São Paulo-SP. Paulus. Pág 143,144)

Há muitos autores católicos romanos que afirmam o contrário, porém nenhum deles cita um só texto agostiniano escrito após o ano de 421. Eles são rapidamente refutados apenas olhando as datas de suas citações.

Vejamos, por exemplo, o autor Francisco Moriones, que para provar a tese contrária, usa a obra de Agostinho – O Pecado Original e a Graça de Cristo, obra escrita em 418, porém, como já foi destacado, a data base é 421. Outro autor cita a obra “O Espírito e a Letra”, obra escrita em 412, simplesmente 9 anos antes de 421. Ora, esses autores estão flagrantemente errados, e a tese de Roque Frangiotti está muito bem estabelecida. As fontes primárias desses autores, nada provam.

Outro autor CATÓLICO ROMANO que concorda com Roque Frangiotti, é o erudito Mathijs Lamberigts, presidente do Curatorium Chair Augustinian Studies ( Universidade Teológica Católica de Utrecht ), afirma o seguinte:

“Seja como for, Agostinho continuou a afirmar que Deus não queria que todos os homens  fossem salvos, indo, assim, de encontro a 1 Tm 2.4 e sua postulação universalidade da vontade salvífica de Deus”. (LAMBERIGTS, Mathijs. Agostinho Através dos Tempos: uma enciclopédia. Editora Paulus. p 803)

Outro autor que defende uma vontade salvífica restrita em Agostinho, é o Padre Garrigou Lagrange, que dispensa apresentações. Ele diz em sua obra “Predestination: The Meaning of Predestination in Scripture” que:

“ Em resposta a esses hereges, Santo Agostinho, argumentando com base no fato de que nem todos os homens são salvos e no princípio da eficácia infalível da vontade divina, FALOU REPETIDAMENTE DE UMA VONTADE RESTRITA DE SALVAR. Com isso ele quis dizer a vontade infalivelmente eficaz que conduz os eleitos à vida eterna.” (LAGRANGE, Garrigou. Predestination: The Meaning of Predestination in Scripture.  Cap V)

Mas o padre vai além, ele afirma que os pelagianos, esses sim, defendiam uma vontade salvífica universal:

“Alguns pelagianos colocaram uma interpretação errada sobre o texto de São Paulo de que “Deus deseja que todos os homens sejam salvos” E AFIRMARAM QUE DEUS DESEJA IGUALMENTE A SALVAÇÃO DE TODOS.” (LAGRANGE, Garrigou. Predestination: The Meaning of Predestination in Scripture.  Cap V)

Novamente:

“Para Santo Agostinho, a predestinação pressupõe UMA VONTADE DECISIVA E DEFINIDA DA PARTE DE DEUS DE SANTIFICAR E SALVAR LIVREMENTE TODOS OS ELEITOS. 13 Deus os conhece individualmente e deseja que eles realizem atos meritórios necessários para entrar no céu. Ele quer dar-lhes a graça de perseverar até o fim, sendo isso o que São Paulo quer dizer quando diz: “Porque é Deus quem opera em vós tanto o querer como o realizar segundo a sua boa vontade”. 14 O fato de Deus prever nossos atos salutares e meritórios pressupõe, segundo o ensinamento de Santo Agostinho, o decreto da vontade divina a respeito desses atos.” (Predestination: The Meaning of Predestination in Scripture.  Cap V)

Em ato contínuo, o autor comenta sobre seguidores de Agostinho, de Próspero e Fulgêncio. Ele diz que São Fulgêncio ensinou igual a Agostinho, complementa dizendo que esse santo FOI MAIS FIEL a Agostinho do que Próspero e que ensinou uma VONTADE LIMITADA de salvar:

São Fulgêncio, chamado “Agostinho em miniatura”, adota como seu todo o ensinamento de Santo Agostinho sobre a graça e sua gratuidade. Ele aceita, também, tudo o que seu mestre ensina sobre predestinação. A predestinação completa, que significa glória e graça, é considerada por ele absolutamente livre, certa e restrita. É absolutamente gratuita porque a graça, sem a qual o homem é incapaz de realizar qualquer boa obra salutar, é puramente um dom da misericórdia de Deus. A predestinação é uma certeza em virtude da onipotente e imutável vontade de Deus. Finalmente, é restrito aos eleitos, que são chamados em manifestação da bondade misericordiosa de Deus em favor deles. Quanto à vontade de Deus de salvar, naqueles textos em que São Fulgêncio fala da VONTADE DIVINA e infalivelmente eficaz de salvar, LIMITA-A, COMO FAZIA SANTO AGOSTINHO” (LAGRANGE, G. Predestination: The Meaning of Predestination in Scripture. Cap V)

Notem que Agostinho interpreta 1 Tm 2.4, em sentido restrito, contra o sentido universal interpretado por Pelágio. O padre Lagrange afirma, em outro lugar, que Pelágio defendeu uma vontade salvífica universal:

“Esta resposta de São João Damasceno (da vontade antecedente e consequente), que és uma resposta no sentido comum e de sentido cristão, de natureza compreensível a todos os fiéis, fazia – de certo modo – abstração da onipotência divina e da eficácia da graça. Assim, deixava subsistir muitas dificuldades do ponto de vista especulativo, aquelas mesmas as quais respondia Santo Agostinho em sua luta contra os PELAGIANOS, QUE DIZIAM – NEGANDO O MISTÉRIO DA PREDESTINAÇÃO – QUE DEUS QUER IGUALMENTE A SALVAÇÃO DE TODOS OS HOMENS E ABUSARAM ASSIM DO TEXTO DE SÃO PAULO (1 TM 2.4)” (LAGRANGE, Garrigou. La Predestinacion de Los Santos y la Gracia. DEDEBEC.p 78.)

CONCLUSÃO

Costumo dizer que a teologia reformada tem teses tão poderosas, que sequer precisamos usar nossos autores para defendê-las. Todos os autores citados são católicos romanos, portanto, destituídos de qualquer tendência a nos favorecer, no entanto, a força do argumento é tão poderosa, que estão prontos a admitir que Santo Agostinho, após o ano de 421, defendeu uma vontade salvífica limitada, não universal, contra a afirmação dos opositores.

Uma resposta em “AGOSTINHO DEFENDEU UMA VONTADE SALVÍFICA LIMITADA? RESPONDEMOS QUE SIM, CONTRA OPOSITORES.”

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