Categorias
Calvinismo

Algo é bom porque Deus quer, ou Deus quer algo porque é bom? Impugnamos a primeira e afirmamos a segunda – contra o voluntarismo de Duns Scotus e Gordon Clark

A essa questão, podemos encará-la de três formas: voluntarismo, exemplarismo e essencialismo. No voluntarismo Deus está acima da lei. No exemplarismo Deus está abaixo de uma lei externa a ele. No essencialismo, Deus é a lei. No voluntarismo, uma lei é boa porque Deus quer que ela seja boa. No exemplarismo a lei é boa independente de Deus. No essencialismo, Deus emite uma lei boa porque ele é bom. Tanto o essencialismo como no exemplarismo, Deus decreta uma lei porque essa lei é boa, no entanto, a bondade do exemplarismo está fora de Deus, e no essencialismo está no próprio Deus, mas anterior à promulgação do comando divino.Nesse trabalho defenderemos o essencialismo. Aqui não se trata de confessionalidade, tivemos reformadores que defenderam tanto o voluntarismo como o essencialismo, trata-se apenas de coerência. Vejamos o esquema abaixo feito pelo professor Gilberto Santos:

Jean Duns Scotus (1266-1308) ou Escoto, foi um doutor franciscano conhecido como Doutor Sutil. Para Escoto, tudo que foi criado, seja as criaturas, sejam as leis naturais ou as leis morais, é efeito da pura e absoluta vontade de Deus. Até aqui parece não ser algo danoso, mas o que Escoto queria dizer com vontade absoluta, era que Deus não criou nada submetido a nenhuma regra, pois para Escoto, a regra era a vontade de Deus. Segundo explica Etienne Gilson, para Escoto:
À parte do princípio de não contradição e imutabilidade, a vontade de Deus é pois senhora absoluta da escolha e da combinação das essências; ela não está submetida à regra do bem, mas, ao contrário, a regra do bem é que lhe está submetida.Se Deus quer uma coisa, essa coisa será boa; e se Ele tivesse querido outras leis morais do que aquelas que Ele estabeleceu, essas outras leis seriam justas, porque a retidão é interior à sua própria vontade, e que nenhuma lei é reta senão enquanto ela é aceita pela vontade de Deus. Não se poderia ir mais longe sem desembocar no cartesianismo; mas antes de desembocar nele, era preciso apagar antes toda distinção entre o entendimento de Deus e sua vontade.1

              Herman Bavinck, diz também a respeito de Escoto: Duns Scotus, defato, negou que exista uma diferença real [ontológica] (distinctio realis)entre o ser [de Deus] e seus atributos, mas defendeu – recorrendo a Agostinho e a João Damasceno – que os atributos de Deus podem ser formalmente distintos do ser de Deus e uns dos outros.2
                Gordon Clark (1902 – 1985), teólogo calvinista do século XX, publicou um livro chamado Deus e o mal, o problema resolvido, onde o mesmo defende a ideia Escotista de voluntarismo divino, no qual ele batiza pelo nome de Ex Lex. Ex Lex quer dizer que Deus está acima da lei, como Escoto defende, a vontade de Deus não está submetida a qualquer regra. Clark afirma o seguinte:
tudo quanto Deus faz é justo e reto. É justo e reto simplesmente em virtude do fato de ser ele quem faz. Justiça ou retidão não é um padrão externo a Deus, ao qual ele está obrigado a se submeter. Retidão é aquilo que Deus faz. Uma vez que Deus causou Judas a trair Jesus [preordenando tal evento], esse ato causal é reto e não pecaminoso. Por definição, Deus não pode pecar. Neste ponto deve ser particularmente indicado que Deus causar um homem a pecar não é pecado. Não há lei, superior a Deus, que o proíba de decretar atos pecaminosos. O pecado pressupõe uma lei, pois o pecado é ilegalidade. Pecado é qualquer falta de conformidade com a lei de Deus, ou qualquer transgressão dessa lei. Mas Deus é “Ex-lex”.3
Clark aqui, no parecer desse autor, parece indicar que o que torna algo moral ou imoral é o comando divino. Há uma distinção entre a criatura e o criador e sua relação com a lei. O texto acima indica que a criatura está sob obrigação por causa da lei divina, ou seja, porque Deus disse que era pra ser assim. Já Deus, que é o legislador, não pode está debaixo desse comando, portanto é Ex Lex, visto que ele é o legislador, não pode Ele mesmo está debaixo da lei. Aqui respondemos que o fato deDeus ser um legislador e por isso a criatura está obrigada a cumprir a lei e Deus não, é totalmente inócuo. Primeiro porque uma série de deveres morais estão intrinsecamente relacionados à razões, que estão para além de comandos morais. Por exemplo, se Deus jamais tivesse ordenado a misericórdia, o amor e a justiça, ainda assim, o homemteria o dever de ser misericordioso, amoroso e justo, pois isso reflete a natureza divina, misericordiosa, amorosa e justa. Existem coisas que só nos obrigam por comando, mas outras não. Por exemplo, só o fato de Deus ter noscriado, já estabelece o dever de adorá-lo, mesmo que Deus nunca tivesse emitido o mandamento de amá-lo sobre todas as coisas. Ademais, se é imoral violar uma mulher (mal moral), nenhum comando (nem mesmo o divino) tornaria isso moral, pois é como se o fato em si mesmo não contasse, quando na verdade é o que conta! E, observemo seguinte: o comando divino já supõe uma adequação perfeitíssima com a própria natureza divina, de modo que o comando é bom, porque Deus é o Sumo Bem: o comando não pode, de si mesmo, tornar algo moral ou imoral. Portanto, essa dicotomia criador-criatura é totalmente desnecessária no tocante a lei.
Outro problema que temos com essa doutrina é que ela não se concilia com a simplicidade divina. Embora Clark nunca tenha negado a simplicidade divina, sua doutrina não é toda coerente com a mesma. Já aprendemos que em Deus, a essência e os seus atributos são um só, de outra forma a simplicidade divina se desfaria e teríamos um Deus composto. Herman Bavinck está certo quando diz que Essa doutrina da simplicidade de Deus foi o meio pelo qual a teologia cristã se afastou do perigo de separar os atributos de Deus de sua essência e tomá-los mais ou menos independentes e opostos à sua essência.4As Escrituras são claras quando a isso, Deus não é somente amoroso, Deus é amor! Deus não é somente sábio, ele é o Logus, a própria sabedoria, Deus não tem eternidade, ele é Eterno, notem, cada atributo de Deus se identifica absolutamente com Ele, pois cada atributo é um reflexo direto e, portanto, indissociável de sua própria essência, dessa forma, as ações de Deus não podem se dissociar de sua essência. Herman Bavinck diz que:
A teologia cristã sempre foi mais ou menos consciente desse chamado. No todo, seu ensino tem sido que Deus é “simples”, isto é, sublimemente livre de toda composição, e que, portanto, não se pode fazer qualquer distinção real [i.e., ontológica] entre seu ser e seus atributos. Cada atributo é idêntico ao ser de Deus: ele é aquilo que possui.5
Agora, se em qualquer caso, a essência não se identifica com a operação de Deus, então teríamos em Deus um acidente, e tudo que tem acidente é composto e, portanto, causado, o que tornaria Deus imperfeito, pois só tem acidente quem pode ser aperfeiçoado. Se Clark e Escoto defendem que a própria lei promulgada por Deus não se aplica a Ele, pois Deus está acima de sua própria lei, então é óbvio que essa lei não pode se identificar absolutamente com a essência de Deus, de outra forma Deus não poderia estar acima dela, portanto, caso os voluntaristas estiverem certos, teríamos um acidente em Deus, já que a sua própria lei não estaria em unidade com sua essência. Quando Clark diz que Deus está acima da lei, e que as coisas são boas porque Deus faz, e não o contrário, segue-se que Deus poderia criar leis morais totalmente contrárias das que foram reveladas na Escritura, e elas seriam tão boas e tão justas quanto as que existem na nossa Escritura. Deus poderia decretar o adultério, e isso seria bom porque Deus quis que fosse.
Gary Crampton, em prefácioao livro Deus e o Mal: O Problema Resolvido, afirma que o pensamento de Clark concorda com o pensamento do reformador Jerome Zanchius, que ensina que a vontade (voluntarismo) de Deus é a causa de tudo:
Neste livro, Deus e o Mal: O Problema Resolvido, Gordon H. Clark tornou disponível à igreja a obra mais precisa sobre o tema. Dr. Clark nos mostra que, permanecendo sobre o firme fundamento da Palavra de Deus, temos a resposta para a questão da teodiceia. Tudo diz respeito à base epistêmica. Tendo a Bíblia como ponto de partida axiomático, a existência do mal não é um problema tão grande assim. Deus, totalmente santo e incapaz de fazer algo errado, decreta soberanamente a ocorrência de coisas más de acordo com os seus bons propósitos. E pelo fato de as ter decretado, esse ato é justo. Como declarou o reformador Jerônimo Zanchius:

A vontade de Deus é de tal modo a causa de todas as coisas, quanto ela própria não tem causa, uma vez que não há nada que possa ser a causa daquilo que causa todas as coisas. Assim, nós encontramos todo assunto resolvido, em última instância, na simples satisfação soberana de Deus. Ele não tem outro motivo para aquilo que faz, além da ‘ipsa voluntas’ , Sua mera vontade – vontade esta tão longe de ser injusta, quanto ela é a própria justiça.6

Esse pensamento deve ser rejeitado por vários motivos. O primeiro é que esse pensamento dissocia vontade do intelecto divino, o que é absurdo, poisambos se reduzem a uma só natureza simples: a essência divina. Em Deus, é impossível que a sua vontade opere desconexa à sua inteligência (pois então não seria providente), bem como é impossível que a vontade divina (antecedente, consequente, etc.) esteja em desconformidade com a essência divina, a qual se reduz (do contrário Deus seria composto, e causado).Uma vontade que não se ordena pelo intelecto, é uma vontade “louca” e arbitrária, defectível. E como é o intelecto divino que guia e apresenta a vontade aquilo que é bom, em primeiro lugar, o intelecto divino pensa naquilo que é perfeito, isto é: em Deus mesmo.
Em segundo lugar,não é esse o ensino daEscritura. A Escritura diz que Deus não pode negar a si mesmo (2 Tm 2.13), ou seja, seu agir é de acordo com sua essência imutável. A Escritura também revela que Deus é imutável em sua vontade, do contrário não poderíamos dizer que ele continua fiel caso sejamos infiéis, e o profeta Malaquias (3.6) não poderia nos revelar que as palavras de Deus que diz: Porque eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos, caso a vontade não se identificasse com a essência. O versículo está claramente atrelado à imutabilidade de sua vontade, notem, a causa de Jacó e seus filhos não serem consumidos, é o fato de Deus ter assumido um compromisso consigo mesmo, pois a lei que ele emite (sua operação) não pode ser dissociada de sua essência, que, obviamente, antecede sua vontade e oferece a base dela, como a vontade é baseada na essência de Deus que é boa, então Deus quer o que é bom, porque quer a Ele mesmo, contrariamente ao voluntarismo clarkeano que diz que algo é bom porque Deus faz. Se a lei fosse algo dissociado da essência divina, a Escritura jamais diria que pecar contra a lei equivale a pecar contra o Senhor, como está escrito: Contra ti, contra ti somente pequei,(Sl 51.4), portanto é deveras absurdo dizer que Deus está acima da lei que Ele mesmo promulga como se o mesmo pudesse ser distinto dela. Assim, é óbvio que Deus não poderia emitir leis totalmente contrárias as que existem hoje, porém, se o ex lexfor verdadeiro, essa possibilidade é verdadeira. Logo, há um padrão ao qual a vontade de Deus deve se conformar, esse padrão é sua própria essência. Fica então demonstrado a falsidade do argumento de que caso Deus queira algo porque esse algo é bom, isso torne Deus sujeito a algum padrão externo, pois uma vez que a lei é um reflexo do próprio Deus, não há problema algum em Deus agir em conformidade com sua essência, não há problema algum em Deus depender Dele mesmo, pelo contrário, problema teria se Ele não agisse em conformidade com sua essência ou dependesse de algo fora Dele, mas dizemos que Deus depende de si mesmo, o que é coerente com a doutrina confessional. Portanto, esteja dado por derrotada essa objeção e premissa de Clark para o Ex Lex.
Francis Turretini explica da seguinte forma:
X. Deus não está obrigado a lei que ele impõe ao homem (ou seja, formalmente, tomando a lei como lei), porém não esta livre e isento de toda a matéria da lei,como se pudesse ordenar ou ele mesmo fazer o que e oposto a ela(por exemplo, crer que ele não e Deus e ordenar que outros creiam nisso – o que soa horrível aos ouvidos piedosos).
XI. Embora a vontade divina seja simples e externamente livre, com base na suposição de um ato livre, ela pode ser necessária a outro (como, se ele quiser prometer absolutamente, devera cumprir a promessa; se ele quiser falar ou revelar-se, devera fazer uma revelação verdadeira; se quiser governar, estará obrigado a governar com justiça). Portanto, a vontade divina não pode ser determinada com base em si mesma, querendo que algo seja ou não seja, mas pode muito bem ser determinada com respeito as complexidades, a retidão das coisas que existem ou que ele quer que existam.7
O que são as leis divinas? São promulgações ex parte Dei? Se forem, são operações e como operações continuam idênticas à essência (a simplicidade de Deus não permite distinção real entre o operar e a essência); se são términos “ad extra” como são por exemplo as criaturas, então as leis estranhamente seriam substâncias ou coisas extrínsecas ao próprio Deus; ou seja, dizer que as leis são distintas da essência de Deus, é como dizer que as leis sejam criaturas, ou coisas extrínsecas, o que é absurdo.
Mesmo que se pudesse postular um voluntarismo para umas leis e outras não, o problema persistiria. Digamos que pudéssemos dizer que apenas algumas leis do decálogo são necessárias, mas não outras, então o problema continuaria, pois qual lei moral do decálogo poderia ser diferente? Deus poderia promulgar uma lei que aprovasse o adultério? Ou que aprovasse o desrespeito ao pai e mãe? Aprovasse o assassinato? Isso tornaria Deus composto, pois sua moral seria distinta de sua justiça, que era ele mesmo. Mas e quanto a outras leis que não poderiam ser diferentes do que são? Dessa forma, a lei divina se identificaria totalmente com o Ser divino, e cairia por terra a pretensão de ter um Deus acima da própria lei, pois, como Deus estaria acima de si mesmo? Se uma lei, não pode ser de outra forma porque ela se identifica totalmente com a natureza divina, então segue-se que essa lei foi promulgada porque a essência de Deus é boa, logo, Deus decretou tal lei porque ela é boa, exatamente o contrário do que Clark prega, a saber, que a lei é boa porque Deus decreta. Essa lei é boa não porque exista abstratamente fora de Deus, essa lei é boa porque se identifica totalmente com a essência de Deus. A bondade aqui não é anterior a Deus, mas somente anterior à emissão do comando divino, que conhecemos como lei.
Gordon Clark costuma usar trechos em que Deus decreta algo pecaminoso, para invocar seu ex lex, assim ele diz que Deus decretou o pecado, mas não pode ser pecaminoso porque ele pode fazer o que quiser, visto que está acima da lei. Dessa forma, Clark rejeita todo o conceito de permissão. Clark cita o reformador João Calvino para endossar sua tese, no seguinte texto:
Aqui recorre-se à distinção de vontade e permissão, segundo a qual querem manter que os ímpios perecem pela mera permissão divina, não porque Deus assim o queira. Mas, por que diremos que o permite, senão porque assim o quer? Pois não é provável que o homem tenha buscado sua perdição pela mera permissão de Deus, e não por sua ordenação. Como se realmente Deus não haja estabelecido em qual condição quisesse estar a principal de suas criaturas. Portanto, não hesitarei, com Agostinho, em simplesmente confessar que “a vontade de Deus é a necessidade das coisas”, e que haverá necessariamente de ocorrer aquilo que ele quis, da mesma forma que aquelas coisas que previu verdadeiramente haverão de vir à existência. Com muita frequência diz-se que Deus cega e endurece os réprobos, volve-lhes o coração, o inclina e o impele, como ensinei mais extensivamente em outro lugar. De que natureza seja isso, de forma alguma se explica, caso se recorra à presciência ou à permissão. (…) para executar seus juízos, mediante o ministro de sua ira, Satanás não só lhes determina os desígnios, como lhe apraz, mas ainda lhes desperta a vontade e firma os esforços. Assim, onde Moisés registra [Dt 2.30] que o rei Seom não concedera passagem ao povo porque Deus lhe havia endurecido o espírito e lhe fizera obstinado o coração, de imediato acrescenta o propósito de seu plano: “Para que o entregasse em nossas mãos”, diz ele. Portanto, visto que Deus queria que ele se perdesse, a obstinação do coração era a preparação divina para a ruína.8
Clark usa essa citação de Calvino, como texto prova de sua doutrina, pois, segundo ele, se Deus decreta o mal, Deus não tem culpa porque está acima da lei,mas, tanto sua afirmação, comosua interpretação do texto,está equivocada. Primeiro porque Clark está assumindo que se Deus não estivesse acima de sua própria lei, Ele de fato seria culpado pelo pecado, isso é o mesmo que dizer que se a lei se aplica a Deus, então Deus de fato pecaria com o que faz. No ver desse autor isso não difere de uma blasfêmia. O conceito de Ex Lexexiste porque se acredita que Deus de fato faça algo imoral para nós, mas que simplesmente dizermos que a regra, que torna tal ato imoral, não se aplica a ele, então Deus não é imoral por ter cometido um ato que ele promulgou ser imoral para nós. Segundoque Calvino intenta refutar uma permissão indolente, não um concurso indiferente que por si só já é permissivo, algo que ele mesmo afirma em sua obra Contra os Libertinosao diferenciar a providência geral de providência particular, sendo a geral indiferente por mover as causas secundárias de acordo com a própria natureza delas, e a particular por uma infusão do material pelo qual Deus intervém para que se faça aquilo que é de sua vontade ética. Aliás, é justamente essa a diferença entre um decreto ativoe um decreto permissivo. O primeiro se trata de uma providência particular, o segundo, de uma providência geral. No primeiro, Deus infunde o material que dá forma ao ato, como por exemplo, o decreto da eleição, que só se executa com a regeneração, ou seja, por uma ação particular de Deus. No segundo, Deus não infunde o material a dar forma ao ato, por ele já existir no agente livre, como no caso dos atos maus. Então para os atos maus, embora seja da vontade de Deus, Ele permite por não impedir a atividade da criatura. Embora seja chamado de decreto permissivo, de forma alguma há uma passividade de Deus, pois a atividade de Deus é positiva, pois não quer impedir que o pecado aconteça. Como Calvino diz: Primeiro de tudo, há uma operação universalpela qual Ele guia todas as criaturasde acordo com a condição e propriedade que Ele deu a cada um quando Ele as fez.9A providência geral é indiferente e portanto permissiva, e é com essa providência que Deus ordena os atos maus, mas somente no sentido de tornar certo, pois conserva e move as coisas fornecendo a energia sem as quais elas nem existiriam. Calvino deixa claro que Deus não é causa formal dos atos maus, nem é de sua aprovação ética que o ato mau aconteça, quando diz:
Primeiro, deve ser observado que a vontade de Deus é a causa de todas as coisas que acontecem no mundo; e, todavia, Deus não é o autor do mal… a causa imediata é uma coisa, a causa remota é outra... certas pessoas sem-vergonha e mesquinhas nos acusam com calúnia de sustentar que Deus é o autor do pecado, se sua vontade é considerada acausa primeirade tudo o que acontece”.10
Veja, Deus é apenas causa primeira, e não a causa imediata e, portanto, não é causa formal, não sendo, portanto, a causa física, pois não infunde o mal, senão que usa o mal já existente no agente livre, o mesmo explica o porquê da justiça divina na continuação do próprio texto citado por Clark, onde Calvino diz que está na criatura a matéria de sua condenação, ou seja, do mal:
Pois, se a predestinação outra coisa não é senão a administração da justiça divina, embora oculta, porém irrepreensível, uma vez que é certo que não eram indignos de sua predestinação para tal fim, também é igualmente certo que a ruína em que caem pela predestinação divina é justa. Além disso, sua perdição de tal maneira pende da predestinação divina, que ao mesmo tempo há de haver neles a causa e a matéria dela.11

Podem os adversários objetarem dizendo que Clark faz a mesma divisão, entre causa remota e causa imedita (chamado por Clark de causa de autoria), ao que respondemos que, se é feita tal divisão, então para que Deus precisa estar acima da lei se ele não age injustamente ao não ser autor de tal ato pecaminoso? Ou seja, simplesmente não há necessidade da doutrina Ex Lex. 
Um texto bastante citado por calvinistas que seguem essa linha de pensamento, é o texto de que Deus endureceu o coração de Faraó, como se Deus tivesse infundido o mal no coração do mesmo. O próprio Calvino refuta esse posicionamento quando diz:
Há, porém, outros testemunhos que vão além, os quais tratam do endurecimento de Faraó: “Endurecerei o coração de Faraó para que não vos ouça [Ex 7.34] e deixe o povo ir” [Ex 4.21]. Em seguida, diz haver-lhe feito pesado o coração e havê-lo enrijecido. Endureceu-o, não o amolecendo? De fato foi isso que aconteceu.12
Dito isto, é conclusivo que é da permissão de Deus que aconteça, já que Deus não infunde o mal, enquadrando-se o evento em uma providência geral, não por um decreto ativo como sugere Clark.
O próprio Calvino, em outro local, citando Agostinho, usa a expressão permissão, mas em contraste a uma permissão absoluta, indolente:
Grandes são as obras de Deus, excelentes em todas as suas vontades [Sl 111.2]; e assim, de maneira mirífica e inefável, não se faça, exceto por sua vontade, o que se faz mesmo contra sua vontade, porque não se faria se ele não o permitisse; nem o permite, como se de qualquer forma não o quisesse; ao contrário, porque o quer;mesmo sendo bom não permitiria que mal se fizesse, exceto que, onipotente, até em relação ao mal pudesse fazer bem.13

Gordon Clark, para corroborar seu ponto de vista, usa o texto de 1Rs 22.20-23, onde Deus envia um espírito de mentira para enganar o Rei Acabe. Segundo Clark, isso é uma prova de que Deus de fato faz o mal e é de sua vontade ética. Mas isso é refutado pelo reformador João Calvino, que não só lembra que ele rejeita não uma permissão propositada, mas uma permissão indolente, mas também que Deus não endossou um mal moral, e sim um castigo divino sobre um homem mau, quer dizer, Deus não precisa ser Ex Lex, porque ele estava aplicando justiça, vejamos:

Portanto, seja o que for que os homens maquinem, ou o próprio Satanás, entretanto Deus retém o timão, de sorte que lhes dirija os propósitos no sentido de executarem seus juízos. Deus quer que o pérfido rei Acabe seja enganado; para esse fim oferece seus préstimos ao Diabo. Por isso é enviado com um mandado definido: que seja um espírito mentiroso na boca de todos os profetas [1Rs 22.20-23]. Se a obcecação e insânia de Acabe é o juízo de Deus, desvanece-se o constructo imaginário da permissão absoluta, pois seria ridículo que o Juiz apenas permitisse o que queria que fosse feito,contudo não o decretasse e não determinasse a execução aos serventuários.14

O reformador também deixa claro que quando Deus age no homem para que o mesmo peque, é para executar juízo, e o juízo se dá porque esses homens já são maus. Deus não coloca maldade nesses homens, ele os pune usando sua própria maldade. Como o material da maldade já está no homem, Deus ao movê-los, torna o pecado certo, e o pecado já atrai a desgraça por si só, e o homem se afunda na própria lama. Assim, o exegeta cita que Absalão violou as concubinas do pai [2Sm 16.22], Deus quis com esse ato infamante punir o adultério de Davi15, lembrando que Absalão era mau. Também cita que Deus queria punir os filhos de Heli com a morte. Para Calvino, o mal acontece ou pelo juízo divino, ou para alcançar um bem maior, nunca se é dito sobre Deus que ele cria o mal moral, ou que ele simplesmente faz o homem pecar porque se agrada o pecado do homem, ou que ele coloca o material da maldade no homem. Calvino afirma:

Conforme a primeira noção, assim se diz: “Se qualquer profeta houver falado enganosamente, eu, Deus, o enganei” [Ez 14.9]; conforme a segunda, porém, diz-se que ele próprio entrega os homens a uma disposição réproba e os lança a vis apetites [Rm 1.28], porquanto de sua justa vingança ele é o principal autor;Satanás, na verdade, é apenas seu ministro.16

Rejeitada também fica a interpretação de Clark da obra calviniana, de onde o mesmo acredita que o reformador ensina voluntarismo. Calvino, no texto citado, ao dizer que “a vontade de Deus é a necessidade das coisas”, e que haverá necessariamente de ocorrer aquilo que ele quis, em hora alguma endossou o voluntarismo, como se a vontade divina fosse dissociada da essência divina, Calvino deixa isso claro quando em outro lugar afirma categoricamente que Deus age por necessidade de sua santidade, de sua natureza que é boa:
Mas, se alguém lhes pergunta: Porventura Deus não é necessariamente bom? Porventura o Diabo não é necessariamente mau? Que responderiam? Ora, a bondade de Deus é a tal ponto entrelaçada com sua divindade, que não lhe é mais necessário ser Deus do que ser bom.O Diabo, porém, em decorrência de sua queda, a tal ponto se alienou da comunhão do bem, que nada pode fazer senão o mal. Porque, se algum sacrílego resmunga que a Deus se deve pouco de louvor por sua bondade, a qual ele é compelido a conservar, não se lhe dará uma resposta imediata, a saber: que ele não pode fazer o mal em razão de sua imensa bondade, não por forçosa compulsão? Portanto, não se impede que a vontade de Deus seja livre em fazer o bem, só porque ele por necessidade opera o bem; se o Diabo, que outra coisa não pode fazer senão o mal, entretanto peca por vontade, quem por isso dirá que o homem peca menos voluntariamente, uma vez que está sujeito à necessidade de pecar?17
Portando está mais do que claro que Calvino defendia que Deus quer algo porque esse algo é bom, visto que a bondade da essência divina antecede a vontade, logo, a vontade escolhe o que é bom, não o contrário.
Clark ainda adiciona mais um argumento, o de que Deus não pode pecar porque é dono de tudo, assim, não pode matar porque é dono da vida, nem pode roubar, porque é dono de toda riqueza. Não discordamos disso, pelo contrário, afirmamos. O problema nesse argumento é que ele descarta o Ex Lex, pois para que haja uma necessidade de Deus está acimada lei, é preciso antes que Deus consiga fazer algo contra a lei, aí se poderia dizer que Deus não está transgredindo a lei por estar acima dela, mas nesse caso agora, Deus não está pecando justamente por agir em conformidade com a lei, não porque a estátransgredindoe a lei não poder ser aplicada a Ele, necessitando assim que ele fosse Ex Lex. Um homem que mata seu próprio Boi, não pode ser sancionado por isso, mas o homem que mata o boi do vizinho é sancionado, isso porque não há transgressão da lei em matar aquilo que você tem o direito de matar. Portanto, o último exemplo de Clark, invés de afirmar o Ex Lex, mostrou como ele é desnecessário. Vincent Cheung, em reposta a John Frame (que demonstrou a falaciosidade desse argumento), concorda que o Ex Lexse torna desnecessário, se partirmos do pressuposto de que Deus é dono de tudo. Ele diz:
O argumento, quer usado contra o ex lex ou não, é simplesmente irrelevante. Por causa da discussão, concordemos primeiramente que as leis morais que Deus impôs sobre a humanidade procedem de sua natureza imutável. Para isso, suponhamos ainda, quer seja verdade ou não, que Deus está realmente limitado por essas leis morais. Como tão frequentemente é o caso, a questão é encerrada quando perguntamos: “E daí? O que uma coisa tem a ver com a outra?”.
A partir do que dissemos acima, segue-se que “não matarás” aplica-se a Deus. Mas, e daí? Frame diria que, portanto, Deus não é ex lex. O que ele fracassa em observar é que esse é um mandamento com conteúdo definido, e não simplesmente algum X indefinido. O que é assassinar? Na Bíblia, assassinato é o término deliberado de uma vida humana sem sanção divina. Podemos adicionar que isso deve ser feito por outro humano, ou pelo menos por outra mente racional, visto que animais não podem realmente “assassinar” no mesmo sentido, mesmo que o ato de matar seja deliberado. Agora, a menos que Deus possa alguma vez matar alguém sem sua própria aprovação, em cujo caso ele seria esquizofrênico (de forma que nosso problema seria muito maior do que ex lex), o mandamento nunca se aplicaria realmente. O mesmo acontece com “não furtarás ”. Não há nada para Deus roubar, pois ele fez todas as coisas, e tudo lhe pertence.
Assim, minha posição não é exatamente ex lex, mas que a grandeza e transcendência de Deus é tal que ele nem mesmo precisa ser ex lex.18

Cheung, partindo do argumento do próprio Clark, mostra que o Ex Lexé totalmente desnecessário. Assim concluímos que Clark mesmo oferece um argumento contra o Ex Lex, o que torna o arrazoado de seu livro, sobre o assunto, auto-refutável, pois não podem serem ambas verdadeiras.
Há algo sutil no pensamento de Clark. Clark faz duas afirmações contraditórias, de modo que se objetamos a uma afirmação, ele logo correrá para a outra, e se objetarmos essa outra, ele correrá para a primeira, ou seja, você pode acusá-lo de voluntarismo por ele dizer que tudo que Deus faz é reto somente porque Deus quer que seja reto, logo, Deus está acima da lei e é portanto Ex lex. Se fizermos uma objeção a isso, mostrando que esse modo de pensar torna Deus composto, ele logo dirá que Deus na verdade está acima da lei porque é dono de tudo e por isso não pode transgredir a lei. Mas a segunda afirmação não é coerente com a primeira. No segundo caso não há necessidade de estar acima de uma lei porque é impossível de ser transgredida pela própria natureza de Deus que sempre a cumpre, é totalmente diferente de dizer que Deus não cumpre a lei e não lhe é imputado uma sanção porqueele está acima da lei, portando, o próprio Clark oferece a ferramenta de sua derrota.
Há uma objeção que poderá ser feita por voluntaristas: se a lei de Deus se identifica totalmente com sua essência, e a essência de Deus é imutável, então como explicar a mudança de leis cerimoniais, ou mesmo no decálogo (sábado para domingo) do Antigo para o Novo Testamento?A resposta está na distinção entre “espírito da lei” e “letra da lei” feita pelos judeus. O espírito da lei era a base moral dela, a letra da lei, era o que estava escrito. Muitas vezes o espírito da lei entrava em contradição com a letra da lei e se ficava com o espírito da lei, não com a letra da lei. Aqueles que ficam infalivelmente com a letra da lei, é chamado apropriadamente de legalista. O que identifica o espírito da lei, é simplesmente o que chamamos de cristão. Os fariseus eram legalistas, as críticas que Jesus fazia a eles foi por esse fato em particular, pois achavam eles que a letra da lei de confundia com o espírito da lei. Por isso jesus foi criticado ao curar no sábado, mas Jesus a letra da lei, mas nunca foi pecado violar a letra da lei, sempre foi pecado violar o espírito da lei. Quero dizer que tem uma lei antes da letra da lei. Existe uma lei antes da promulgação do comando divino. A primeira é imutável, a segunda é mutável, pois somente aponta a direção, é o aio. É por isso que teses como o ex lexsão absurdas além de serem anti-bíblicas porque não é o comando divino em forma de letra que torna o ato imoral, mas a essência que provocou a promulgação daquela letra, então quando Deus diz “não matarás”, essa lei existe para preservar a vida das pessoas, mas se eu tenho um homem correndo com uma bomba que vai matar 50 pessoas, eu posso abatê-lo (ou seja, romper com a letra da lei, já que estou matando), para poder preservar a vida das pessoas, ou seja, eu estou obedecendo a lei, desobedecendo a letra da lei. Exatamente por isso que a coisa não é certa porque Deus mandou mas ela já era antes do comando, antes da promulgação da lei escrita, na verdade ela era eterna como o próprio Deus é. A lei “não matarás” na verdade é apenas uma letra, a lei verdadeira é: “preserve a vida das pessoas o quanto puder”.
No evangelho de Marcos, cap 7, Jesus faz a seguinte críticaaos fariseus: Porque Moisés disse: Honra a teu pai e a tua mãe; e quem maldisser, ou o pai ou a mãe, certamente morrerá. Vós, porém, dizeis: Se um homem disser ao pai ou à mãe: Aquilo que poderias aproveitar de mim é Corbã, isto é, oferta ao Senhor;Nada mais lhe deixais fazer por seu pai ou por sua mãe, (Marcos 7:10-12). A situação era:pessoas que estavam deixando os pais passar fome porque os fariseus obrigavam a dar odízimo, colocando as pessoas no seguinte dilema:se eu não der o dízimo, eu estou pecando, mas se eu der o dízimo estarei desonrando pai e mãe e também estarei pecando, então jesus recrimina a atitude dos fariseus de cobrar o dízimo até de quem não tinha para dar.Ora, o objetivo do dízimo é sustentar o templo, não é de tirar a dignidade de ninguém. Então a lei do dízimo, na letra,é entregar10%, mas a verdadeira lei é: “sustente o tempo”. Aletra da lei, ou seja, a promulgação do comando divino em forma de lei,é que serve como aio, ela aponta a direção,e portanto pode ser mudada para outra que aponte melhor a mesma direção, mas a verdadeira lei é imortal. Aletra da lei muda, mas a verdadeira lei nunca muda. Épor isso que as leis cerimoniais podem mudar, mas nunca veremosDeus pedindo o sacrifício de crianças invés de uma ovelha. Deuspoderia colocar um coelho, uma vaca, um grilo que fosse, como sacrifício,mas uma criança nunca! Pois isso transgrediriao mandamento eterno de preservar a vida das pessoas.
Usando um exemplo do cotidiano,imaginemos umpolicial rodoviário, e avia que ele fiscalizapode rodarsomente a 60 km/h, quando de repente passa um carro a 100 Km/h. Obviamente esse carrotá transgredindo a lei, então o policialatrás do carro,quando eleconsegue interceptar o carro, elever que o motoristatá com um filho morrendo no carro e tem que chegar ao hospital o mais rápido possível. Observem, se o policialaplicar uma multa naquele pai que quer salvar o filho, elevai tá sendo cruel, porqueaquele homemprecisa salvar umavida, ou seja, o policialvai pecar por obedecer a letra da lei, multando o indivíduo ao invés de ajudá-lo, porquea bendita lei de velocidade existe para que as pessoas não se matem, mas se por causa da obediência a letra da lei uma pessoa vai perder a vida, então ela não serve mais de nada, então é melhor desobedecer a letra da lei para obedecer o espírito dela, salvando uma vida.Obedecer cegamente a letra da lei de torna cruel. Isso prova que não é o comando divino que torna algo bom, mas tem uma base anterior a promulgação da lei da divina que já boa e que pode ser chamada de espirito da lei. A lei escrita aponta para essa lei.Épor isso que Cristo diz que o sábado foi feito para o homem e não o contrário, a lei também foi feita para o homem, não o contrário. Dessa forma, mostramos que a tese voluntarista é totalmente superficial, pois se prende ao comando divino, não à essência divina da lei.
Referências
1GILSON, E. A filosofia na idade média. Martins Fontes. 1995. p 745. Disponível em: https://marcosfabionuva.files.wordpress.com/2012/04/e-gilson-a-filosofia-na-idade-mc3a9dia.pdf . Acesso em 07/12/2018.
2BAVINCK, H. Vol 2. 2012. p 122
3CLARK, G. Deus e o Mal – O problema resolvido. Monergismo. 2010. p 81.
4BAVINCK, H. Vol 2. 2012. p 121
5BAVINCK, H. Vol 2. 2012. p 120.
6CLARK, G.H. Deus e o mal: O problema resolvido. Monergismo. 2010. p 6
7TURRETINI. Vol 1. 2011. p 314
8 CALVINO. Institutas 3.23.8
9CALVINO, J. Contra la sect des Libertins. Corpus Reformatorum. Vol 35. Organizado por CUNITZ, Edouard (Ed.), BAUM, Johann-Wilhelm (Ed.), REUSS, Eduard Wilhelm Eugen (Ed.). Joannis Calvini opera quae supersunt omnia. Brunsvigae : C.A. Schwetschke. 1863. p 186.
10 CALVINO apud WRIGHT, R. K. M.G. Quem é o autor do pecado? Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/autor-pecado_wright.pdf . Acesso em 15/07/2018
11 CALVINO. Institutas 3.23.8
12 CALVINO. Institutas 2.4.4
13CALVINO, J. Institutas 1.18.3
14CALVINO, J. Institutas. 1.18.1
15CALVINO, J. Institutas. 1.18.4
16CALVINO, J. Institutas. 1.18.2
17 CALVINO J. Institutas. 1.3.5.
18CHEUNG, V. Melhor do que “Ex Lex” . Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/apologetica/ex_lex_cheung.htm . Acesso em 07/12/2018.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.