Esse é o primeiro artigo de um debate entre mim e o apologista americano Dave Armstrong sobre Justificação pela Fé.
Ressalto que esse debate é prioritariamente bíblico-exegético, podendo ter recursos da Teologia Sistemática.
Estabelecimento da Questão
Fides Justificat Sola (somente a fé justifica), esse foi o brado dos reformadores contra a doutrina de Roma que ensina que a fé e as obras justificam. Sola (somente) não é por razão de existência i.e., solitária, sem graça e amor, mas com respeito à função ou eficiência. Assim, embora a fé sozinha justifique, não podemos afirmar que a fé possa existir sem a graça, sem amor e sem obras. A fé é inseparável da graça e das obras, mas não são as mesmas coisas, tal qual o pulmão que sozinho é responsável pela força da respiração, mas jamais funcionaria desligado dos outros órgãos como o fígado e coração. Luz e calor no sol estão tão relacionados a ponto de serem inseparáveis, no entanto, a só luz ilumina e só o calor aquece. Portanto, embora as demais virtudes não justifiquem juntamente com a fé, não há justificação na ausência delas, muito menos estando presentes os vícios opostos.
A questão não é se uma pessoa que tenha fé possa ser admitida sem obras ou sem amor, mas se essas obras são causas da justificação, isso negamos. Não é porque exigimos obras concomitantemente a fé, que às duas têm as mesmas finalidades.
A questão não é se as obras não podem ser vistas como justificantes de algum modo, mas que somente através da fé a justiça de Cristo é imputada sobre nós.
A disputa também se dá em relação ao modo da justificação, se é por imputação ou se é por infusão de justiça. Nós afirmamos ser por imputação, e negamos que seja por infusão de justiça.
A justificação pode ser vista sob um duplo ângulo: o ângulo da lei e o ângulo do evangelho. Pelo ângulo da lei somos culpados diante de Deus por violá-la, logo devemos ser livres dessa culpa, o que só se faz através da imputação da justiça de Cristo em nós mediante a fé somente. Pelo ângulo do evangelho somos acusados por satanás de incredulidade e hipocrisia caso não mostremos que temos fé através das boas obras. O primeiro se justifica somente pela fé, o segundo se justifica com fé e obras.
Bases Escriturísticas que Confirmam a Justificação Somente pela Fé
Com base em Romanos 3.28:
“Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé sem as obras da lei”. Romanos 3:28
O texto é claro que somos justificados somente pela fé. Ora, somente uma das 3 vias é possível:
1 – Ser é justificado somente pela fé;
2 – Ser justificado somente pelas obras ou,
3 – Ser justificado pela fé e pelas obras.
Como o versículo afirma que somos justificados sem as obras, então sobra-nos que somos justificados somente pela fé e não pelas obras.
Nenhuma antítese seria criada entre fé e obras se as duas contribuíssem para a justificação. O mesmo se dá em Gálatas 2.16: “sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus”.
Com base em Gálatas 2.21:
A justiça de Cristo só pode ser apreendida pela fé, não pode ser pelo amor, esperança ou qualquer outro meio que não seja a fé: “Não aniquilo a graça de Deus; porque, se a justiça provém da lei, segue-se que Cristo morreu debalde” (Gl 2:21).
A justiça não vem da lei, portanto não poderá vir pelo cumprimento da mesma, senão que somente da fé em Cristo Jesus.
Com base em Gn 15.6:
“E creu ele [Abraão] no Senhor, e imputou-lhe isto por justiça”
Gn 15:6.
No Novo Testamento esse fato é lembrado diferentes vezes (Rm 4:3; Rm 4:22; Gl 3:6; Tg 2:23) e é usado pelo apóstolo Paulo como um exemplo de que a justificação tanto no Antigo como no Novo Testamento é uma só. Essa verdade assim como a exegese de outros textos, demonstram que quando São Paulo fala de obras da Lei, ele não está falando somente dos judeus, mas de todos os homens, pois Abraão viveu antes da Lei, além disso, todos pecaram, não somente judeus, e todos precisam de justificação. Assim, o que ocorreu com Abraão ocorre com todas as pessoas, somente pela fé tem a justiça imputada sobre si, não uma justiça infusa como pensam os romanistas, mas uma justiça imputada como defenderam os reformadores. Não há aqui uma linguagem de infusão de justiça ou de virtudes, mas de uma imputação da justiça. A justificação é forense: “Mas, àquele que não pratica, mas crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça” (Rm 4:5).
Com base em Romanos 4.6:
Davi diz a mesma coisa, quando fala da felicidade do homem a quem Deus imputa justiça independente de obras: Romanos 4:6
Se a imputação da justiça independe das obras, logo é somente pela fé que a justiça é imputada sobre o homem.
Com base em Romanos 5.9:
“Logo muito mais agora, tendo sido justificados pelo seu sangue” (Rm 5:9).
Os méritos de Cristo são perfeitos, seu sacrifício é perfeito e satisfaz toda justiça divina. Obra nenhuma pode complementar tal justiça satisfeita na cruz, pois o Senhor Jesus disse: “Está consumado” (tetelestai) está completo, nada mais falta, o preço foi pago. Se as obras não nos fazem merecer os méritos de Cristo, sobra que é somente pela fé que recebemos o sangue e os méritos de Cristo que nos justifica. Como diz São Paulo: “quem intentará acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica” (Rm 8.33). O próprio Cristo é a nossa justiça: Portanto, vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se tornou para nós sabedoria da parte de Deus, justiça, santificação e redenção, a fim de que, como está escrito: “Aquele que se glória, glorie-se no Senhor”. Pregação no poder do Espírito. (1 Co 1.30,31). Cristo é a justiça perfeita que é apreendida somente pela fé, devemos nos gloriar Nele, em suas obras e em seus méritos.
Com base em Filipenses 3.9:
“E seja achado nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus pela fé” (Fp 3:9).
Mais uma vez o apóstolo faz uma antítese entre obras da lei e a fé, elas não têm a mesma finalidade de justificar diante de Deus.
Coram hominibus vs Coram Deo
Trataremos agora do duplo ângulo da justificação: o ângulo da lei (Coram Deo) e o ângulo do evangelho (Coram hominibus).
Algumas passagens na Escritura dão a entender que um homem não pode ser justificado somente pela fé, mas também pelas obras. O texto de Tg 2.21-26 ensina que Abraão (bem como Raabe e os homens em geral) foi justificado pelas obras? Vejamos:
“Porventura o nosso pai Abraão não foi justificado pelas obras, quando ofereceu sobre o altar o seu filho Isaque?
Bem vês que a fé cooperou com as suas obras, e que pelas obras a fé foi aperfeiçoada.
E cumpriu-se a Escritura, que diz: E creu Abraão em Deus, e foi-lhe isso imputado como justiça, e foi chamado o amigo de Deus.
Vedes então que o homem é justificado pelas obras, e não somente pela fé.
E de igual modo Raabe, a meretriz, não foi também justificada pelas obras, quando recolheu os emissários, e os despediu por outro caminho?
Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta.” Tiago 2:21-26
O texto não é contraditório com os textos de Paulo. Note que o próprio texto trata de obras, não somente da Lei, mas de obras. São Tiago está lutando contra os libertinos, enquanto São Paulo estava lutando contra legalistas. Se por um lado São Paulo teve que provar que as obras não justificam, mas que as obras de Cristo que nos justificam através da fé, São Tiago tinha que provar que não bastava dizer ter fé e não ter obras. Assim o mesmo cita exemplo de homens que foram justificados diante dos homens mostrando a vida de sua fé através das obras. Aqui destaco que São Tiago em momento algum ensina que tais homens tinham fé, mas que eles diziam ter fé, mas não demonstravam essa fé com boas obras, eram como demônios que tem uma fé morta.
O texto não está tratando de um Coram Deo, de uma justificação sob o olhar divino, mas sob o olhar humano.
CONCLUSÃO
Para não ficar exaustivo, acredito que esses textos são suficientes, podendo ser ampliados na medida da necessidade.
Uma resposta em “A Justificação pela Fé na Perspectiva Protestante”
Most of the debate is really about if “Imputation of Christ’s Righteousness” is in the Bible. If it is not clearly taught in the Bible, then it is a tradition of men. None of the verses you quoted mention Imputation of Christ’s Righteousness. Consider that just because a verse says that faith justifies, this does not specify whether that faith justification is imputation or something else.
Galatians 2:21 says that if righteousness came by obeying the law, then Christ died for no reason. But imputation teaches that righteousness came by Christ obeying the law, which is a direct contradiction with Gal 2:21. Righteousness cannot come by keeping the law. The righteousness that Christ gives comes by the Cross and Resurrection, not by obeying the law. In his Institutes 3:11:9, John Calvin explains 2 Cor 5:21 as Christ becoming Incarnate, by the taking on “the likeness of sinful flesh,” which is why the ESV and NASB both cross reference Rom8.3, and so do the Early Church Fathers. No imputation is taking place.
Genesis 15:6 says that Abraham’s faith was reckoned as righteousness. The Hebrew/Greek term “reckoned” also appears in Romans 3:28, where it says “we reckon that faith justifies”. To ‘reckon’ is to form an accurate conclusion. Nehemiah 9:8 interprets this for us: “You found his [Abraham] heart faithful before you, and made with him the covenant to give to his offspring the land of the Canaanite. And you have kept your promise, for you are righteous.” This is precisely how Paul interprets it in Rom 4:18-22. In Galatians 3:5, Paul says we receive the Holy Spirit by faith, as he quotes Genesis 15:6. The receiving of the infusion of the Holy Spirit is how Paul understands Justification (Gal 3:2).
In Romans 4:5, Paul speaks of God “justifying the ungodly” and then says “David says the same thing” when speaking of “reckoning righteousness apart from works”. So to reckon righteousness apart from works means to justify the ungodly. Thus, ungodly is the one who is apart from works. The same language in Rom 3:28 says “justified by faith apart from works of the law”. So a person can be justified without the law, just as David was miraculously forgiven of his adultery, even though the law could not forgive adultery, some other covenant was able to forgive/justify him. For God to forgive the ungodly does not require imputation. What they needed was infusion, as Paul says in Philippians 3:10, to be conformed to his death and resurrection. This is why Paul says in Col 2:13 & Eph 2:5 that “you who were dead in your trespasses and the uncircumcision of your flesh, God made alive together with him, having forgiven us all our trespasses.” To be made alive is salvation for Paul, this is infusion.