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Deus é Autor do Pecado? Afirmamos que NÃO! – Contra Vincent Cheung


Vincent Cheung declara o seguinte:
Seja Deus o autor do pecado ou não, não há nenhum problema bíblico ou racional em Ele ser o autor do pecado.3
No pensamento de Vincent Cheung, se Deus a tudo decreta, então segue-se que Ele é o autor1do pecado. Concordamos com João Calvino quando diz que eles são ignorantes e maliciosos que dizem que Deus é o autor do pecado, se todas as coisas são feitas por sua vontade ou ordenação; porque eles não distinguem entre a maldade manifesta dos homens e os juízos secretos de Deus2.
Cheung, reconhece que a doutrina reformada nega que Deus seja autor do pecado, a resposta que o autor dá é: E daí? Pelo menos ele não tenta se esconder por trás de uma falsa interpretação das confissões como faz Gordon Clark, no entanto, devemos ficar sempre alertas a teólogos que se revestem de autoridade tal, adotando uma falsa doutrina do princípio da Sola Scriptura,de forma que ache que todos estão errados e somente ele certo, pois isso implicaria que o Espirito Santo agiu somente nele, e não nos outros. Cheung assim diz:
Quando cristãos reformados são questionados sobre se Deus é o “autor do pecado”, eles são muito rápidos em dizer, “Não, Deus não é o autor do pecado”, e então eles se torcem, se viram e se contorcem no chão, tentando dar ao homem algum poder de “auto-determinação” (e.g. Hodge, Dabney, Shedd, etc.), algum tipo de liberdade que torne o homem culpado (mesmo quando não há nenhuma relação estabelecida entre liberdade e culpabilidade), e, todavia, ainda deixar Deus com soberania total.

Por outro lado, quando alguns alegam que minha visão da soberania divina faz de Deus o autor do pecado, minha primeira reação tende a ser, “E daí?”. Cristãos que discordam de mim cantarolam estupidamente, “Mas ele faz de Deus o autor do pecado, ele faz de Deus o autor do pecado…”. Contudo, uma descrição não se eleva a um argumento ou objeção, e eu nunca me deparei com uma explicação nem sequer meio-decente do que há de errado em Deus ser o autor do pecado em nenhuma obra teológica ou filosófica, escrita por qualquer um, de qualquer perspectiva. Seja Deus o autor do pecado ou não, não há nenhum problema bíblico ou racional em Ele ser o autor do pecado.3

Mas o autoré contraditório na exposição de sua tese,vejamos:
1 Cheungdefende que Deus não cria o mal como substância4.
Não estamos usando a palavra “criar” no mesmo sentido da criação original de Deus do nada, mas estamos nos referindo ao controle de Deus sobre coisas que Ele já criou. Isto é, embora os maus pensamentos e as inclinações devam ser ativamente causadas na criatura por Deus, e, portanto, Ele deva ativamente causar a má ação correspondente, todavia, Ele não cria um novo material ou substância quando Ele faz isto, visto que Ele está controlando o que Ele já criou.
É verdade que uma pessoa peca segundo a sua natureza má, mas como Lutero escreveu, é Deus quem “cria” esta natureza má em cada pessoa concebida segundo o padrão do Adão caído, cuja queda Deus também causou.
E então, Deus deve ativamente causar esta natureza má para funcionar e a pessoa age de acordo com ela. Lutero escreveu que Deus nunca permite que esta natureza má fique ociosa em Satanás e nas pessoas ímpias, mas Ele continuamente a faz funcionar por seu poder5.

Aqui ele afirma, corretamente, que Deus move a criatura de acordo com a natureza má, caída de Adão, e que não devemos pensar que Deus cria uma natureza má, mas que ele move essa natureza já criada. No entanto, o mesmo, contraditoriamente ironiza a crença reformada de que Deus não é autor do pecado, e, claramente afirma que as disposições más não vieram de Adão, nos levando a concluir que, segundo seu pensamento, a maldade de Adão veio de Deus, e que Deus infundiu voluntariamente o mal moral em Adão. Assim escreve:
Deus não diz, “Oh, não, Eu não sou o autor do pecado. Embora Eu seja a causa última de todas as coisas, Eu me distancio de causar diretamente o mal ao estabelecer causas secundárias e agentes livres. Assim, embora eu crie e sustente todas as coisas, os homens pecam livremente, pensando e agindo segundo as suas próprias disposições. As disposições más vêm de Adão. Quanto a como Adão adquiriu suas disposições más….bem, isto simplesmente terá que permanecer um mistério para você”. Se esta é a resposta, por que não pular direito para o mistério e nos economizar algum tempo?6
Trataremos com mais exaustão do caso Adão no meu próximo artigo, onde ofereceremos resposta a pergunta “de onde veio o pecado de Adão?”. Por enquanto, se o que Cheung quer é uma justificativa Bíblica, dizemos com clareza que a Escritura afirma que Deus fez ao homem reto, mas ele buscou muitas invenções.(Ecl 7.29), a pergunta é, segundo a Escritura, quem buscou muitas invenções? Deus ou homem? Segundo a Escritura, Deus fez o homem torto com disposições más ou criou ele reto?
O argumento de Vincent Cheung se resume no seguinte: Deus criou Adão, logo, Deus criou a disposição para o pecado de Adão.Cheung primeiro precisa provar que a causa deve participar do defeito do efeito. Um defeito não precisa ser herdado da causa, justamente porque é natural a causa superar o seu efeito. O defeito é uma desordem, uma ausência de ordem, portanto não é algo positivo que precisa ser gerado, mas algo de negativo que o efeito tem menos que a causa, logo, não precisa estar na causa ou ser gerado pela causa. Se a causa supera seu efeito, então ela não precisa participar da falta que porventura exista no efeito. Se o defeito do homem é algo causado por Deus, então Deus deve ter esse defeito também em si, pois tudo que tem no efeito, de positivo, deve estar também na causa, logo, seria o mesmo que dizer que o pecado está em Deus e que Deus também seria imperfeito ou que o próprio Deus tem alguma disposição para fazer um ato não santo. Cheung por acaso concorda que Deus seja imperfeito? Cheung sequer chega a abordar tal problema.
Cheung também usa o Dr.Martinho Lutero para embasar sua tese. Ele diz:
É verdade que uma pessoa peca segundo a sua natureza má, mas como Lutero escreveu, é Deus quem “cria” esta natureza má em cada pessoa concebida segundo o padrão do Adão caído, cuja queda Deus também causou.
E então, Deus deve ativamente causar esta natureza má para funcionar e a pessoa age de acordo com ela. Lutero escreveuque Deus nunca permite que esta natureza má fique ociosa em Satanás e nas pessoas ímpias, mas Ele continuamente a faz funcionar por seu poder7.

O argumento de Cheung é que Lutero, teria dito que Deus causa essa natureza má no homem, ao movê-lo, e, portanto, Deus seria o autor do pecado do homem. Porém, essa abordagem está extremamente equivocada.A prova cabal, é que, curiosamente, Lutero não entendia que sua doutrina levava a conclusão de que Deus fosse autor do pecado de alguma forma. Lutero, responde justamente a esse mesmo argumento que Cheung usa, mostrando que em seu ensino, ele quer dizer algo totalmente diferente. É perguntado a Lutero O bom propósito não vem da livre vontade do ser humano. Logo, os seres humanos pecam por necessidade, e consequentemente Deus é autor do pecado. Lutero prontamente responde, refutando tal argumento que Cheung repete:O ser humano não peca por necessidade,mas por querer. Deus não é autor, porque não ordenou que pecássemos, muito antes o proibiu. Mas a causa do pecado são o diabo e nossa vontade.8
O “causar o pecado”, na visão de Lutero, não estava associado a uma infusão do mal ou a uma vontade ética de Deus, mas ao mover físico que mantém cada agente racional existindo. Assim, Lutero entende que, Deus move os homens maus de acordo com as suas próprias naturezas, mas que o mover de Deus sempre é bom e é a natureza do homem que é má. Mas vejamos, se o mover de Deus é sempre bom, como pode Deus ser causa direta a ponto de ser chamado de autor do pecado? No máximo poderíamos conceder que Deus éuma causa acidental do mesmo, visto que o material do mal não flui da moção divina.Lutero faz duas ilustrações que demonstram seu ponto de vista, na primeira ele representa o homem mau como um cavalo sem patas, e na segunda como um machado cheio de dentes:
Logo, aquilo que chamamos de remanescente da natureza no ímpio e em Satanás não está menos sujeito, como criatura e obra de Deus, à onipotência e à ação divina do que todas as outras criaturas e obras de Deus. Assim, visto que Deus a tudo move e atua em tudo, também move necessariamente a Satanás e o ímpio e neles atua. Porém, atua neles de modo correspondente ao que são e a como os encontra, isto é: já que são desviados emaus, e são arrebatados por essa manobra da onipotência divina, fazem somente o que é contra Deus e mau. É como se um cavaleiro cavalgasse um cavalo que anda sobre três ou duas patas; conduz o cavalo de acordo com suas condições, ou seja, o cavalo anda mal. Que pode fazer o cavaleiro? Conduz ocavalo como conduz cavalos sãos, aquele mal, estes bem; não pode ser diferente a não ser que o cavalo seja curado. Aqui vês que quando Deus opera nos maus e por meio dos maus certamente o mal acontece, e contudo Deus não pode agir mal ainda que faça o mal por meio dos maus; pois, sendo ele próprio bom, não pode agir mal, mas faz uso de instrumentos maus que não podem escapar da apropriação e da manobra de sua potência. Portanto, o defeito está nos instrumentos aos quais Deus não permite ser ociosos; por isso, o mal acontece porque o próprio Deus o põe em movimento. É exatamente como se um carpinteiro cortasse mal com um machado cheio de rebarbas e dentado. Daí resulta que o ímpio não pode senão errar e pecar sempre, pois, movido pela apropriação da potência divina, não se lhe consente ser ocioso, mas quer, deseja e age de modo correspondente ao que ele é.9
Cheung então ensina que Deus “cria” o pecado porque move o homem a um ato pecaminoso, e cita Lutero, que, curiosamente, discorda frontalmente da visão de Cheung. Os teólogos da época de Lutero costumavam dizer que Deus era causa motora, mas não era uma causa ética ou formal do pecado, e Lutero não parece discordar desse parecer (para entender melhor esse posicionamento, indicamos esse artigo). Cheung também não aborda tal questão.

REFERÊNCIAS
1O filósofo Gordon Clark faz uma diferenciação entre causa e autoria. Para Clark Deus causa o pecado, mas não é autor do pecado, pois não é ele mesmo quem pratica o mal moral. Nossa objeção está muito além disso. A objeção aqui apresentada é se Deus aprova o ato pecaminoso, ou seja, se Deus é causa formal do ato pecaminoso, ou se Deus cria o pecado assim como cria o bem, visto que na interpretação, de Gordon Clark, de Isaías 45.7, os dois polos, bem e mal, são colocados no mesmo patamar. Objetamos também que essa diferença entre causa e autoria tenha qualquer eficácia contra nossos argumentos, pois estamos falando de uma criação metafísica do pecado, não estamos falando da prática do pecado. Clark deixa claro, em sua interpretação de Is 45.7, que Deus cria o pecado, se cria, então é o autor do mesmo, se Deus pratica o mal moral ou não, isso é irrelevante, nunca pretendemos objetar a isso.
2BOER, E.A. John Calvin’s ‘Disputatio de Praedestinatione’ The relevance of a manuscript on his doctrine Providence and Predestination. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/260318549_John_Calvin’s_’Disputatio_de_Praedestinatione’_The_relevance_of_a_manuscript_on_his_doctrine_Providence_and_Predestination>. Acesso em: 31/12/2018.
4CHEUNG, V. Por que Deus Criou o Mal? http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/cheung_porque_deus_mal.htm
5CHEUNG, V. Por que Deus Criou o Mal? http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/cheung_porque_deus_mal.htm
6 CHEUNG, V. O Autor do Pecado. Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/cheung_autor_pecado.htm
7CHEUNG, V. Por que Deus Criou o Mal? http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/cheung_porque_deus_mal.htm
8 LUTERO, M. Obras Selecionadas. vol 4. Debates e Controvérsias II. Sinodal. p 404
9LUTERO, M. Obras Selecionadas. vol 4. Debates e Controvérsias II. Sinodal. p 128

5 respostas em “Deus é Autor do Pecado? Afirmamos que NÃO! – Contra Vincent Cheung”

Ainda quero ler seu proximo artigo, se tiver disponível, coloca o link. Mas ainda nao foi respondida a questão. Um defeito na natureza do efeito nao pode surgir do nada se o defeito nao foi criado. aliás, se nao houvesse a existência do mal, jamais poderia haver sua possibilidade. Não é possível que haja algo que não existe.

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